No coração do Paraná, Mandaguari se destaca por sua abordagem inovadora em saúde. Com pouco mais de 38 mil habitantes, a cidade foi a primeira do Sul do Brasil a aprovar a distribuição de cannabis medicinal pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e agora institui o Projeto de Lei 84/2024, que cria uma carteirinha para pacientes em tratamento. A proposta, de autoria do vereador Chiquinho (PP/PR), visa facilitar o acesso e o uso seguro do canabidiol (CBD).
“Essa carteirinha garante que o paciente tenha respaldo jurídico, proporcionando qualidade de vida”, afirma Chiquinho, defensor ativo da democratização do uso medicinal da planta. Ao contrário do clima de controvérsia que muitas vezes envolve o tema no Brasil, Mandaguari adota uma postura acolhedora, reconhecendo a cannabis como um aliado no tratamento de diversas condições.
A lei foi aprovada de maneira rápida e unânime, evidenciando o compromisso da Câmara Municipal com a causa. “Foi uma votação excepcional, com dispensa dos prazos habituais”, comenta o advogado Murilo Nicolau, que acompanhou de perto a sessão.
Inspirada pela legislação nacional de 2023, que introduziu um símbolo para identificar portadores de doenças invisíveis, a carteirinha tem a função de tornar visíveis as necessidades de quem utiliza a cannabis para tratamento. Isso pode evitar constrangimentos, como aqueles enfrentados por pacientes que, ao usarem o medicamento, muitas vezes precisam justificar seu uso. “Um motorista de caminhão, por exemplo, poderá apresentar a carteirinha e não enfrentará problemas no exame toxicológico”, explica o vereador.
O movimento em favor da cannabis medicinal em Mandaguari ganhou força graças a mães de crianças autistas que, desde 2018, se reuniam para compartilhar experiências e apoiar os tratamentos. A Associação de Familiares Autistas de Mandaguari surgiu desse esforço coletivo. Josiana Pires, mãe de Heloísa, de 9 anos, relata como o extrato de cannabis transformou a vida de sua filha: “O CBD reduziu em 90% os episódios de comportamento repetitivo que ela apresentava.”
Casos como o de Heloísa foram fundamentais para as discussões públicas sobre o uso medicinal da cannabis, resultando na lei 3789/2023, que garante a distribuição gratuita do medicamento para epilepsia e autismo. Apesar de o SUS abranger apenas essas condições, muitos pacientes se beneficiam dos derivados da cannabis para tratar dor crônica, estresse, ansiedade e insônia.
O próximo passo para Mandaguari é iniciar o plantio e a produção do óleo, em uma parceria entre a Prefeitura e a universidade local. Essa iniciativa já inspira cidades vizinhas, como Jandaia do Sul e Apucarana, que também buscam aprovar a distribuição do medicamento. “Mandaguari se destaca por mostrar que, com o apoio do poder público, é possível fazer uma grande economia, já que atender 50 famílias custa cerca de R$ 1 milhão por ano”, conclui Nicolau, ressaltando a importância desse modelo para outras localidades, inclusive fora do estado.